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Reconhecendo nossa humanidade nos tornamos leves



Ontem a noite, em nossa paróquia, o pároco propôs uma celebração penitencial, muito apropriado para a Semana Santa, vendo-a como oportunidade de preparação para melhor celebrar o mistério de Jesus Ressuscitado. Mas o que mais me chamou atenção não foi a celebração em si, mas a sabedoria que brota da vivência do nosso povo simples.


Logo após a celebração duas senhoras iam a conversar pelas ruas vizinhas da Igreja e uma delas comentou muito alegremente: "Confissão é bom porque a gente lembra do que fez e volta leve." E de fato, nos deixa leve, não porque estamos seguindo um preceito da Igreja ou porque é "lei" que se confesse. Nos deixa leve quando percebemos que é uma das oportunidades que temos de tomar consciência de nossa humanidade, com suas limitações e dificuldades mas também com nossas potencialidades.


Como cristãos, espelhamo-nos nas palavras que os evangelistas colocam na boca de Cristo: o filho que pede a herança, deixa o Pai e tudo gasta de maneira desregrada é o mesmo que tem a grandeza de reconhecer sua pequenez, colocar-se como servo e voltar ao Pai (Lc 15,11-32); o publicano que colabora com a exploração do povo pelo Império Romano se sente livre frente ao Pai para demonstrar-lhe na simplicidade toda a sua miséria (Lc 18,9-14); a ovelha desgarrada, a "rebelde", é a que demanda os maiores cuidados do pastor, que após reencontra-la se alegra com toda a sua casa (Lc 15,4-7).


"A gente lembra do que fez e volta leve"... na esteira de Jesus e do evangelho Lucano, é no caminho que se toma consciência de como podemos ser limitados, de como nos esquecemos facilmente do que realmente nos toca o coração, de como as nossas relações humanas podem ser frágeis, ou seja, tomamos consciência de que somos gente! (cf. Lc 24,13-35). Gente que pode SER assumindo sua humanidade e partindo disto ter mais ânimo para seguir a vida. Nosso Deus é um Deus que nos acolhe como somos. E nem podia ser diferente, porque assim ele nos criou. Ele está pronto a nos reconduzir à dignidade de seres humanos com potencialidade de mudar de vida, de traçar novos caminhos, mesmo que até então não tenhamos dado nenhum fruto (Lc 13, 6-9).


Neste tempo de preparação para a Páscoa, não nos esqueçamos que celebrar Jesus Ressuscitado é antes celebrar um Jesus presente na história, que fez caminho, que assumiu sua condição humana. Não nos privemos de viver nossa condição humana. É a partir dela que também podemos SER em plenitude porque o divino, sendo Deus, quis se tornar humano e dar, por sua Encarnação e Ressurreição, um sentido totalmente novo à existência humana.


E quando isto nos é possível, quando recebemos o dom de reconhecer nossa humanidade de maneira positiva e aberta nos tornamos livres e leves, somos acolhidos (por Deus) quando nos acolhemos (a nós mesmos) em nossa inteireza. E aqui não há condição de censura, só há festa... E a trilha desta festa até poderia estar em versos "vercilianos": "levitar dos colibris, graciosamente breve, como pode tão feliz? Censurar, ninguém se atreve!"





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